Parlamento da Guiné Equatorial deve abolir completamente a pena de morte e melhorar a lei anti-corrupção

O Parlamento da Guiné Equatorial deve melhorar a lei anti-corrupção e, para uma completa eliminação da pena de morte no país, além da reforma do Código Penal, deve alterar a Constituição. Em alternativa, deve ser ratificado o Segundo Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, destinado a abolir a pena de morte.

A 23 de fevereiro último, o terceiro vice-Primeiro-Ministro do Governo, responsável pelos Direitos Humanos, anunciou oficialmente a alteração ao Código Penal da Guiné Equatorial, que excluirá a pena de morte. Esta é a primeira vez que esta reforma é anunciada por escrito através de meios de comunicação oficiais. Esta reforma entrou no Parlamento, um procedimento que pode ser longo, se tivermos em conta que tem de passar mais tarde pelo Senado.

O Senado está também em processo de revisão do Decreto-Lei sobre a Prevenção e Combate à Corrupção aprovado pela Câmara Baixa em julho de 2020. A abolição da pena de morte estaria  incompleta se o Código de Justiça Militar não fosse também alterado.

O artigo 13 da Constituição estabelece que a pena de morte é regulamentada por lei. Existem atualmente, pelo menos, duas leis em vigor que contêm a pena de morte: o Código Penal, que está atualmente em processo de reforma, e o Código de Justiça Militar de 1945, aplicável às forças armadas e às forças de ordem pública. Ambos os textos, ainda em vigor na Guiné Equatorial, pertencem à era da ditadura franquista.

A alteração do Código Penal, eliminando a pena de morte, não impediria os militares de serem condenados à morte quando são julgados pela jurisdição militar. Recorde-se que o Código de Justiça Militar de 1945 é tão anacrónico que prevê o julgamento de civis, em alguns casos, algo que tem acontecido na Guiné Equatorial.

A reforma do artigo 13 é possível com o voto afirmativo de três quartos dos senadores e deputados (art. 133.3 da Lei Fundamental). Contudo, segundo o Observatório dos Direitos Humanos e Boa Governança do APROFORT, a ratificação do Segundo Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Unidas sobre Direitos Civis e Políticos seria o mecanismo mais rápido para a abolição da pena de morte. Em ambos os casos, iniciaria um efeito de cascata legal que automaticamente tornaria sem efeito qualquer lei que incluísse a pena de morte.

Em qualquer caso, e para evitar uma possível execução desta pena na justiça militar, é necessário que a moratória ou suspensão da pena de morte em vigor desde 2014 na sequência da adesão da Guiné Equatorial à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa permaneça em vigor.

Código penal obsoleto

O novo Código Penal é necessário porque a versão atual está em vigor desde antes da independência da Guiné Equatorial da Espanha em 1968, ou seja, o Código Penal da ditadura de Franco. Este código obsoleto contém multas em pesetas, por exemplo, gerando grande insegurança jurídica, uma vez que os juízes não aplicam um critério lógico de conversão. A alteração do Código Penal em geral, para além de eliminar a pena de morte, poderia também ser útil para proporcionar uma maior segurança jurídica.

Lei anti-corrupção pode ser melhorada

Em julho de 2020, o Decreto-Lei Anti-Corrupção foi aprovado como parte do plano de boa governança acordado com o Fundo Monetário Internacional. Este texto legal está agora a ser revisto pelo Senado, apesar de, tendo em conta a natureza do instrumento, um decreto-lei seja considerado como já aplicável, tal como declarado pelo Procurador-Geral da República.

No entanto, como assinala a Comissão de Juristas da Guiné Equatorial na sua análise, esta lei requer melhorias substanciais. Especificamente, deveria incluir regras sobre a extradição em casos de corrupção internacional; deveria evitar a criminalização da sociedade civil, uma vez que é um ator-chave na prevenção da corrupção, como salientado pelas Nações Unidas; deveria excluir advogados e investigadores em alguns crimes, porque poderia ter um efeito contrário a uma proteção judicial eficaz; e, finalmente, a lei deveria deixar claro se o presidente e o vice-presidente devem fazer uma declaração de património, à semelhança dos restantes funcionários públicos.

De acordo com o Índice de Percepções de Corrupção 2020 da Transparency International, a Guiné Equatorial é vista como um dos países mais corruptos de África.

Compromissos de Direitos Humanos e Boa Governança da Guiné Equatorial

A abolição da pena de morte significaria o cumprimento das promessas assumidas, tanto perante as Nações Unidas, como perante a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A abolição da pena de morte foi uma das principais condições para a admissão da Guiné Equatorial na CPLP, tendo em conta que a língua oficial da Guiné Equatorial é o espanhol.

Como indicado anteriormente, o acordo entre o Fundo Monetário Internacional e o Governo da Guiné Equatorial prevê a publicação de uma lei anti-corrupção. Este acordo tem um valor de 282 milhões de dólares, desembolsados em tranches, à medida que os compromissos são cumpridos. Até agora apenas os 40 milhões de dólares iniciais foram desembolsados. A última análise do Observatório dos Direitos Humanos e Boa Governança da APROFORT concluiu que apenas 20% deste acordo estava a ser cumprido.

Finalmente, após a ratificação da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção em 2018 e da Convenção da União Africana sobre a Prevenção e Combate à Corrupção em 2019, a Guiné Equatorial também se viu obrigada a elaborar uma lei anti-corrupção.

O APROFORT é um projeto financiado pela União Europeia e tem como objetivo abolir a pena de morte na Guiné Equatorial, proteger ativistas e promover o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, incluindo a boa governança. Com a alteração do Código Penal e a aprovação da atual revisão do Decreto-Lei Anti-Corrupção, estão a ser dados passos no sentido do cumprimento destes compromissos, embora haja uma ampla margem para melhorias.