O Global Corruption Barometer, divulgado pela Transparency International esta terça-feira, revela que quase dois terços das pessoas na União Europeia acredita que a corrupção governamental é um problema no seu país. Num inquérito a mais de 40 mil pessoas no espaço comum europeu, procurou-se saber opiniões e experiências de corrupção das pessoas e os resultados destacam algumas tendências preocupantes.
Trata-se de um dos maiores e mais detalhados inquéritos sobre as opiniões das pessoas sobre corrupção e experiências de suborno nos 27 países da União Europeia. Foram realizados inquéritos a mais de 40 mil pessoas no espaço comum europeu, entre outubro e dezembro de 2020.
Este relatório contém recomendações detalhadas, bem como uma análise detalhada por país dos resultados de cada Estado-membro. Estes resultados serão discutidos num evento online, esta terça-feira, a partir das 14 horas. Inscrições aqui.
Os deputados e os parlamentos nacionais são tidos como as instituições mais corruptas na Europa, e o mesmo se passa em Portugal, onde 27% das pessoas diz que a maioria dos deputados são corruptos ou facilitadores da corrupção. Quanto aos membros do governo, 16% acredita que são corruptos, e 15% refere que o primeiro-ministro está envolvido em corrupção.
O setor privado também não é visto com bons olhos: 25% dos europeus acha que os administradores de grandes empresas estão envolvidos em corrupção e 23% diz o mesmo dos banqueiros. No nosso país, este número sobe para 33%.
Urge pois uma boa e transparente aplicação dos códigos de conduta do governo e dos deputados, bem como a regulação do lóbi que garanta eficácia e transparência.
Segundo o Barómetro Global da Corrupção, mais de metade dos europeus pensa que as regras da contratação pública não são seguidas à risca pelos governos. Pelo contrário, acreditam que os contratos públicos são atribuídos através de subornos e ligações pessoais entre governantes e empresários.
Em Portugal 63% das pessoas entende que a administração central e local se encontra capturada por interesses empresariais e privados. Além disso, 74% dos portugueses acreditam que as grandes empresas fogem ao pagamento de impostos.
Quase três em cada dez residentes na União Europeia relataram já ter pago um suborno ou feito uso de ligações pessoais e/ou familiares para aceder a serviços públicos. Isto equivale a mais de 106 milhões de pessoas no espaço europeu. Em Portugal, apenas 3% das pessoas reconheceram ter pago algum tipo de suborno, mas 48% usaram ligações pessoais e/ou familiares para aceder a serviços públicos.
Quanto aos cuidados de saúde, apesar de apenas 6% das pessoas admitir ter pago um suborno para aceder a serviços de saúde, 29% dos residentes da União Europeia dizem ter usado ligações pessoais e/ou familiares para obter cuidados médicos. Em Portugal, este número chega a quase metade (46%).
Estas são conclusões particularmente preocupantes no atual contexto pandémico. Não são apenas os que sofrem com o COVID-19 que necessitam de apoio médico. Governos em toda a União Europeia estão a implementar planos de vacinação para proteger os mais vulneráveis, destinando milhares de milhões de euros para o pós-pandemia, através dos respetivos planos de recuperação e resiliência. A corrupção ameaça tudo isto com consequências bastante graves.
Durante uma crise de saúde, a utilização de ligações pessoais para aceder aos serviços públicos pode ser tão prejudicial como o pagamento de subornos. Há vidas que podem perder-se quando pessoas recebem uma vacina COVID-19 ou tratamento médico antes das pessoas com necessidades mais urgentes porque fizeram uso de ligações pessoais.
É crucial que os governos em toda a União Europeia redobrem oesforços para assegurar uma recuperação justa e equitativa da pandemia em curso
Para a Transparency International, rede mundial de ONGs anti-corrupção representada no nosso país pela Transparência e Integridade, Associação Cívica (TI Portugal), os resultados do inquérito são claros sobre o envolvimento da sociedade civil na luta anticorrupção: quase dois terços (64%) dos europeus acreditam que os cidadãos podem fazer a diferença no combate à corrupção, sendo que em Itália, Portugal e Irlanda, este número ultrapassa os 80% da população.
Nas palavras de Karina Carvalho, Diretora Executiva da TI Portugal, “o envolvimento pessoal de cada uma e cada um na luta anti-corrupção é crítico, e é muito significativo que no nosso país cada vez mais pessoas se mobilizem contra a corrupção e o mau uso de recursos públicos. Só cidadãos informados e ativamente envolvidos neste combate podem exigir e responsabilizar os governos para que estes façam mais e melhor, impedindo que a corrupção prospere e mitigando os seus impactos”.
Numa altura em que está em curso a transposição da Direita Europeia de Proteção de Denunciantes, a situação em Portugal é preocupante: 58% das pessoas temem ser alvo de retaliação em caso de denuncias de corrupção.
A existência de canais apropriados para a denúncia de episódios de corrupção é fundamental. No entanto, muitos denunciantes ainda enfrentam várias formas de retaliação, como o despedimento, processos em tribunal ou ofensas à integridade física, pelo que importa saber de que forma se assegurará a correta implementação da lei em Portugal, assegurando que ninguém é excluído dos mecanismos de proteção.
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