Luanda Leaks

Portugal falhou na supervisão do sistema financeiro

O papel dos supervisores e reguladores no caso Luanda Leaks tem sido questionado, e em particular a atuação do Banco de Portugal (BdP) relativamente ao EuroBic de Isabel dos Santos

As regras da EU determinam que se identifiquem os países terceiros com debilidades nos sistemas de prevenção BCFT tendo em conta que podem constituir uma ameaça sistema financeiro da UE. As medidas de diligência sobre os clientes estabelecidos em “países terceiros de risco elevado”, como Angola, devem ser reforçadas, o que não sucedeu nem com Isabel dos Santos, nem com o próprio EuroBic.

E por isso temos dito que a atuação do Banco de Portugal (BdP) relativamente ao EuroBic de Isabel dos Santos deve ser questionada.

Fundado em 2008 enquanto braço português do angolano Bic de Isabel dos Santos, rapidamente se tornou um dos maiores bancos a operar no país desde a compra do BPN em 2012. Liderado primeiro por Mira Amaral, ex-Ministro da Indústria e Energia, e a partir de 2016 por Teixeira dos Santos, ex-Ministro das Finanças, em pouco mais de uma década o investimento de 40 milhões de euros no nacionalizado BPN redundou em lucros superiores a 42 milhões de euros, com uma carteira de crédito ascendendo a aproximadamente 5.000 milhões de euros e depósitos na ordem dos 5.700 milhões de euros.

Com o eclodir do Luanda Leaks ficámos a conhecer melhor os problemas deste banco, que estava já a ser fiscalizado desde 2015 por apresentar falhas nos seus sistemas internos de prevenção do BCFT, mas até ao momento nada se sabe sobre os resultados das auditorias do BdP, e poucas dúvidas subsistem sobre a utilização do EuroBic como ferramenta para os negócios corruptos de Isabel dos Santos em Portugal.

À semelhança de outros bancos portugueses ao serviço da cleptocracia angolana, como denunciado pelo Organized Crime and Corruption Reporting Project (OCCRP) numa investigação sobre a forma como as elites angolanas foram construindo uma rede de bancos privados para transferir as suas riquezas para a União Europeia

How Angolan Elites Built a Private Banking Network to Move Their Riches Into the European Union

Além do Eurobic, também citado nas FinCEN Files – uma nova investigação baseada nos relatórios de atividade suspeita (SARs) enviados à Financial Crimes Enforcement Network (FinCEN) do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos provando que ao longo de anos um conjunto de bancos continuaram a movimentar pagamentos sinalizados como suspeitos, ao mesmo tempo que prometiam às autoridades de supervisão o reforço dos seus controlos internos de prevenção e combate ao branqueamento de capitais – o trabalho do OCCRP faz referência a bancos angolanos com operações em Portugal, como o Banco de Negócios Internacional (BNI Europa) e o Banco Millennium Atlântico (Banco Atlântico Europa), este último com estreita ligação ao Banco Comercial Português (Millennium BCP), recentemente alvo de uma queixa por alegadamente ter facilitado esquemas de lavagem de dinheiro proveniente de suborno a ex-quadros da petrolífera estatal angolana Sonangol.

Foto: Getty Images