Vistos Gold: um sprint pela calada

O número de Vistos Gold atribuídos por Portugal disparou 500% em maio, tornando-o um dos “melhores” meses de sempre, desde o início do programa em 2012. Ao todo, foram atribuídos 270 vistos só naquele mês.

Esta explosão dos vistos acontece a meio de uma crise sanitária global, que congelou a circulação de pessoas e aumentou a incerteza económica e no ano em que ficou inscrito no Orçamento do Estado que haveria mudanças no programa – mudanças esse que foram claramente esquecidas pelo executivo e pelo parlamento.

Este crescimento exponencial do número de Vistos Gold em maio suscita-nos duas questões:

  1. Admitindo que o número de vistos atribuídos em março (55) e abril (53) diminui, em termos relativos, por causa da limitação de recursos humanos devido ao confinamento, como foi possível uma recuperação tão rápida do trabalho em atraso? A TI-PT sempre acusou o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de ter poucos controlos sobre a origem do dinheiro e dos candidatos aos vistos, o que acabou por ser confirmado pelo próprio SEF. Sem um apuramento da veracidade dos documentos fornecidos ou sobre o perfil dos candidatos, é a segurança nacional e europeia que fica em causa.
  2. Mantendo-se a preferência de compra de imobiliário como forma de obter o visto (em maio de 2020, 95% dos vistos foram concedidos através desta opção) e considerando que a mobilidade internacional está quase congelada, de que forma foram estes imóveis escolhidos e comprados? Através de visitas online, parece, como fez saber de forma efusiva uma das mais importantes consultora imobiliárias: A consultora JLL revela que a venda de casas não parou, tendo desde o dia 13 de março, concluído (…) mais de 10 novas vendas de casas com contacto exclusivamente online”. É sabido que a compra de um imóvel sem visita ao local enquadra-se nos indicadores de risco de branqueamento de capitais. E é também sabido que o setor imobiliário não leva a sério as suas obrigações de due diligence no combate ao branqueamento de capitais.

O primeiro semestre de 2020 tem sido difícil e excecional, mas o escândalo #LuandaLeaks e a crise económica e social provocada pelo COVID-19 já nos deram uma lição: o investimento sem planeamento ou sustentabilidade, sem olhar à origem do capital, apenas na procura do dinheiro fácil e rápido tem um preço.

É urgente pôr um fim ao regime dos Vistos Gold para que não seja a próxima crise a rebentar.