Não vamos tolerar mais o ataque das Big Tech às nossas vidas e à nossa liberdade
Assinámos esta semana a People’s Declaration, juntando-nos a mais de 100 organizações da sociedade civil, que representam 71.872.881 de cidadãos da União Europeia para dizer às grandes empresas tecnológicas que não vamos tolerar mais o ataque corporativo às nossas vidas e à nossa liberdade de que somos alvo.
Os sistemas e algoritmos da Big Tech – como o Facebook ou a Google – amplificam o discurso de ódio e a desinformação online e as revelações feitas por Frances Haugen, a denunciante do Facebook, vieram não só confirmá-lo, como acrescentar um dado ainda mais preocupante: os algoritmos foram desenhados para funcionar desta maneira. Isto é, são parte integrante de um modelo de negócio inconsciente e pouco ético.
Através deste incentivo velado ao discurso de ódio, os utilizadores passam mais tempo nas plataformas. Com este modelo de negócio, potencia-se ao máximo o consumo de anúncios, em que os consumidores são incentivados a dar o seu “consentimento” para serem vigiados e rastreados.
A utilização de serviços digitais não pode ser condicionada à aceitação da vigilância e definição de perfis de consumidor anónimos. É necessária transparência na publicidade online e uma verdadeira aplicação dos nossos direitos sobre os nossos dados pessoais, ainda para mais numa altura em que a Autoridade de Proteção de Dados da Bélgica considerou que estes pop-ups de consentimento violam o Regime Geral de Proteção de Dados (RGPD).
Segundo a D3 – Defesa dos Direitos Digitais, que também assinou esta declaração, “a manter-se, esta decisão “apenas e só” coloca em causa todo o modelo atual de publicidade na Internet”, considerando que é “a maior violação de dados já registada”. Ou seja, este modelo de negócio “é incompatível com o RGPD e o consentimento que têm usado não serve de fundamento legal para o processamento de dados que [as empresas como a Google] realizam”.
A única solução para isto é devolver aos utilizadores o controlo sobre os seus dados pessoais. As Big Tech não podem continuar a tomar decisões sobre as nossas vidas. Devem ser conferidos poderes mais amplos aos reguladores para que estas empresas tecnológicas sejam responsabilidades, incluindo poderes de auditoria robustos. Na Europa, não podemos permitir que as falhas na aplicação da lei se repitam, como tem acontecido com o RGPD.
Chegou por isso o momento de estas grandes empresas tecnológicas removerem os riscos para os utilizadores das suas plataformas, depurarem os seus algoritmos, darem aos utilizadores um controlo real e serem responsabilizadas se o não fizerem.
Em julho do ano passado, a Transparency International lançou uma atualização do Integrity Watch, no sentido de aumentar o escrutínio do trabalho dos eurodeputados, ao permitir um acompanhamento das reuniões com lobistas. Atualmente, 373 dos 704 eurodeputados (cerca de 53%) publicaram reuniões com lobistas. Portugal está acima da média, com 61,8% dos eurodeputados a divulgarem essa informação.
No início deste ano, a Transparency International EU publicou um relatório sobre os esforços de lóbi de empresas como a Amazon, Apple, Google, Facebook ou Microsoft junto do Parlamento Europeu e de vários governos europeus, detalhando as suas atividades em Bruxelas, Paris, Dublin e Londres.
“É evidente que os gigantes da tecnologia dedicam recursos significativos para influenciar a política da União Europeia. Por exemplo, o orçamento interno do lobbying da Google em Bruxelas aumentou 360 por cento desde 2014 e continuamos a ver as grandes empresas de tecnologia classificadas entre os lóbistas com as reuniões de mais alto nível com a Comissão Europeia”, disse Raphael Kergueno, Policy Officer da Transparency International EU e autor principal do relatório.
Se está nas nossas mãos exigir às grandes empresas tecnológicas que acabem com os ataques corporativos às nossas liberdades e privacidade, é também responsabilidade das autoridades pressionarem as Big Tech e não cederem à sua chantagem.