Apagão do Portal BASE: o que está em causa?

Imagem: SIC Notícias

O Portal BASE sofreu sofreu um apagão, na semana passada, devido a problemas na publicação de alguns contratos, que mantinham visíveis os nomes, moradas, números de telefone e números do cartão do cidadão, em clara violação do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD).

Porque a transparência não é opcional, nem o RGPD pode ser instrumentalizado para aumentar a opacidade da contratação pública, insurgimo-nos contra a decisão do governo de impedir a consulta dos contratos, situação que entretanto foi “corrigida”.

Na segunda-feira o Governo informou que o Portal BASE voltou a estar online, mas sem a possibilidade de serem consultados os termos dos contratos celebrados, o que continua a levantar sérios obstáculos ao conhecimento pleno sobre o uso de dinheiros públicos e dos negócios do Estado.

O Código dos Contratos Públicos obriga a que sejam publicados, neste portal gerido pelo IMPIC, todos os elementos referentes à formação e execução dos contratos públicos, porque tal é indispensável para acompanhar e monitorizar a despesa pública. Ora, quem consulta o portal com frequência já percebeu que a informação disponibilizada pelas entidades contratantes é quase sempre residual e que, sem a leitura dos contratos, pouco se sabe sobre o seu objeto e fundamentos de aquisição dos bens ou serviços.

Temos alertado sucessivamente para a falta de publicação dos contratos públicos sem maior consequência e, por isso, a notícia de que o portal foi apagado não nos surpreendeu.

O que está aqui em causa?

  1. A transparência e o acesso à informação constituem princípios norteadores do direito administrativo, devendo ser inscritos em todas as atividades e procedimentos, incluindo naturalmente na área da contratação pública, conforme estabelecido nos artigos 3.º a 19.º do Código de Procedimento Administrativo;
  2. O princípio da transparência, previsto no Código dos Contratos Públicos, estabelece os deveres de publicitação para todas as etapas dos procedimentos de contratação pública – desde a sua fase inicial, ou seja, da intenção de contratar, até à execução do contrato, passando naturalmente pela definição das regras e dos termos da adjudicação de bens e serviços –, assim como de todas as condições dos contratos celebrados e a identificação de todos os intervenientes;
  3. A informação constante do Portal BASE e o cumprimento das normas nacionais e comunitárias referentes à proteção de dados pessoais é da exclusiva responsabilidade das entidades adjudicantes.

Assim, antes de apagar os dados simplesmente, conviria saber o que falhou na comunicação entre as entidades adjudicantes e o Portal BASE. Que mecanismos existem para assegurar o compliance com o RGPD? E, igualmente, que mecanismos continuam a faltar para garantir que todos os contratos públicos – mas mesmo todos os contratos públicos – são devidamente publicados e escrutináveis?

Numa altura em que estão já em marcha investimentos públicos suportados pelas verbas do Plano de Recuperação e Resiliência e outros financiamentos comunitários, não pode ser opção deixar-nos sem acesso ao Portal BASE ou, melhor dizendo, sem acesso a todas as informações que nos permitam conhecer e aferir da propriedade dos gastos públicos.

A contratação transparente não se proclama. Materializa-se.