Processo de Rui Pinto coloca a nu as fragilidades da proteção de denunciantes em Portugal

Foto: Rui Gaudêncio/PÚBLICO

Rui Pinto, o homem por detrás das fugas de informação conhecidas por Football Leaks e Luanda Leaks, começou esta sexta-feira a ser julgado por 90 crimes – 68 de acesso indevido; 14 de violação de correspondência; seis de acesso ilegítimo; sabotagem informática à SAD do Sporting; e por tentativa de extorsão ao fundo de investimento Doyen.

Na perspetiva da Transparência e Integridade, trata-se de um caso muito complexo, porque as acusações formuladas contra Rui Pinto são indissociáveis dos vários inquéritos que estão em curso graças às suas revelações. O tribunal vai ter de encontrar um equilíbrio entre o mal que se provar que Rui Pinto fez com o bem que as revelações provocaram e, a partir daí, encontrar uma sentença justa, porque é fundamental que qualquer eventual pena preserve a capacidade de Rui Pinto continuar a colaborar nas investigações que estão em curso, tanto em Portugal como no estrangeiro.

Igualmente relevante, este caso vem demonstrar que a definição de denunciante (whistleblower) deveria contemplar pessoas que não têm necessariamente uma relação profissional com a organização denunciada, não só para que revelações como as de Rui Pinto não sejam silenciadas, mas sobretudo por causa de muitos cidadãos que, por exemplo, em municípios pequenos, têm conhecimento de crimes ou irregularidades na câmara local e que, mesmo sem serem funcionários da câmara, têm medo de denunciar: ou porque têm um familiar que lá trabalha ou porque o próprio denunciante trabalha numa empresa privada do concelho que não quer más relações com o presidente da câmara e pode despedi-lo na mesma para preservar essa relação próxima com o poder. Pessoas nestas circunstâncias não estão protegidas.

Mas o caso Rui Pinto dá-nos também razão quando dizemos que o que existe atualmente na lei portuguesa sobre a proteção de denunciantes mais não é do que um artigo avulso numa lei avulsa, e um ou outro artigo nas diretivas anti-branqueamento de capitais.

E por isso é que nos batemos, conjuntamente com outros capítulos europeus da Transparency International, pela aprovação da Nova Diretiva de Proteção de Denunciantes, a ser transposta para a legislação nacional até dezembro de 2021. Esta diretiva confere um regime de especial proteção a denunciantes em contexto profissional agindo em defesa dos interesses da EU, mas claramente não chega.

É fundamental que a proteção de denunciantes seja expandida para todas as áreas da vida pública nacional, e que todas as pessoas que revelem informações de interesse público sejam protegidas.

Para saber mais sobre o estado da proteção de denunciantes em Portugal e a transposição da nova diretiva, consulta a nossa página dedicada:

Proteger Quem Denuncia