Sejam bem-vindos ao combate pela separação de poderes e pela integridade das instituições

 

O Governo respondeu ao nosso segundo pedido de acesso à informação sobre o caso de nomeação do procurador europeu. Na resposta ao nosso pedido, a Ministra da Justiça afirmou que ia procurar saber, junto do Conselho da União Europeia, se podia enviar-nos a documentação solicitada, isto apesar de termos demonstrado que, por um lado, é ilegal negar o acesso aos documentos, alegando que se tratam de “actividade política”, visto que a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos não faz a distinção entre documentos políticos e documentos administrativos; e, por outro, que o Governo tem a discricionariedade de facultar-nos a documentação enviada ao Conselho da União Europeia, uma vez que é o autor material desses mesmos documentos, e não tem de pedir autorização para o fazer.

A mesma argumentação foi utilizada pela Ministra da Justiça no Parlamento, naquilo que só pode ser visto como uma clara estratégia para ganhar tempo. Uma pessoa questiona-se se isto é incompetência ou má fé, porque ganhar tempo para quê, ao certo? Ninguém sabe.

Mais tarde, já no Parlamento Europeu, sublinhou que o Ministério da Justiça e o Governo continuam “inteiramente disponíveis para esclarecer tudo aquilo que for necessário”, acenando novamente com “as limitações relacionadas com a problemática do acesso aos documentos e dos dados pessoais” quando o Parlamento Europeu solicitou todos os documentos deste processo.

Na mesma audição, a Ministra da Justiça, que calha ser também a presidente do Conselho da União Europeia para a Justiça, seguiu as pisadas da Ministra da Saúde, ao permitir-se a um desabafo a pedir paz na Procuradoria Europeia. Defendeu Francisca van Dunem que a “Procuradoria Europeia precisa de estabilidade, precisa de paz para trabalhar” e que o objectivo é “pô-la operacional, (…) resolver estas questões com grande rapidez e não eternizar um problema que pode perfeitamente ser clarificado e esclarecido ao Parlamento”. E acrescentou, mais recentemente, que vai esclarecer este caso até que a voz lhe doa.

Ou seja, para a Ministra da Justiça e o Governo português, é a pretensa conspiração internacional contra Portugal, agora com o respaldo de vários grupos políticos do Parlamento Europeu, que está a impedir que a Procuradoria Europeia arranque. Faz lembrar o “Deixem-nos trabalhar!“, célebre desabafo de Cavaco Silva (mais um), para quem o trabalho de escrutínio a quem governa é uma perda de tempo. É caso para dizer: sejam bem-vindos ao combate pela separação de poderes e pela integridade das instituições.

Tem razão a Ministra da Justiça quando diz que o problema “pode perfeitamente ser clarificado e esclarecido”. Esqueceu-se certamente a Ministra da Justiça de que a maneira mais rápida e eficaz de encerrar esta questão é dar o acesso à documentação que as várias instituições, a nível nacional e internacional, têm vindo a reclamar. Para isso, não precisa de ficar rouca. Basta tirar as mãos dos bolsos e entregar os documentos.

Opinião de João Oliveira
Técnico de Comunicação da Transparência e Integridade