
Transparência Internacional Portugal acompanha com preocupação notícias sobre Operação “Torre de Controlo” e reforça o seu alerta recente sobre o aumento dos riscos de corrupção no setor da Defesa em caso de flexibilização nos procedimentos de contratação pública sem o reforço dos devidos mecanismos de fiscalização
A Transparência Internacional Portugal (TI Portugal) manifesta a sua mais profunda preocupação face às suspeitas de corrupção reveladas pela Operação “Torre de Controlo”, conduzida pela Polícia Judiciária, que envolve elementos da Força Aérea Portuguesa e empresas privadas ligadas a concursos públicos para o fornecimento de meios aéreos de combate a incêndios. As suspeitas incluem formação de cartel, tráfico de influências, corrupção e abuso de poder, representando um sério atentado à integridade da contratação pública no setor da Defesa.
Estas revelações surgem num momento especialmente sensível, marcado por uma crescente pressão europeia para o aumento significativo e acelerado da despesa pública no setor da Defesa e consequentes propostas nacionais de alteração e agilização do quadro legislativo da contratação pública neste setor, onde se destaca a criação de uma “via verde” para a contratação na Defesa, proposta pelo Ministro da Defesa Nacional, para “ultrapassar burocracias” e “complicações” associadas ao controlo do Tribunal de Contas e à litigância pré-contratual.
A TI Portugal reforça que qualquer proposta de agilização não pode ser feita à custa da fiscalização e da garantia da legalidade, nomeadamente num setor estruturalmente exposto a riscos de corrupção. A TI Portugal relembra os resultados do Government Defence Integrity Index 2020, em que Portugal obteve 44 pontos em 100, classificando-se com risco elevado de corrupção, abaixo da média da UE (59 pontos) e apenas à frente de quatro países da NATO. Entre as áreas mais críticas, aquele barómetro identifica:
1. A pontuação mínima na área das operações militares, incluindo missões internacionais;
2. A falta de fiscalização parlamentar efetiva e procedimentos de controlo eficazes;
3. A opacidade nas atividades de entidades públicas como a idD Portugal Defence;
4. A ausência de doutrina e orientações claras para a prevenção de conflitos de interesse e enraizamento de uma cultura de prevenção e combate aos riscos de corrupção no setor militar
A TI Portugal alerta que um reforço de investimento num sector que já hoje representa 1,6% do PIB nacional, com cerca de 380 empresas e 40 mil postos de trabalho, tem de ser concretizado com a garantia de integridade dos investimentos públicos, não reproduzindo os erros cometidos no PRR, onde o fim do visto prévio do Tribunal de Contas e a redução do contencioso criaram um ambiente de fragilidade legal e fiscalizatória, que não deve ser replicado. A retórica da “eficiência” não pode justificar a erosão dos controlos constitucionais.
Numa altura em que se inicia uma nova legislatura, TI Portugal reforça as recomendações que emitiu no âmbito da sua iniciativa Caderno de Encargos Legislativas 2025, para garantir um equilíbrio saudável entre agilidade, legalidade e integridade na contratação pública, nomeadamente no que se refere:
1. Transparência plena nos contratos públicos de Defesa
- Publicação acessível, atempada e integral de todos os contratos públicos, incluindo beneficiários, montantes, critérios de adjudicação e alterações contratuais, incluindo reforço da eficácia da CADA e interoperabilidade entre plataformas de dados públicos.
2. Fiscalização robusta
- Reforço dos poderes fiscalizadores da Assembleia da República e do Tribunal de Contas, garantindo auditorias independentes e eficazes.
3. Prevenção de conflitos de interesse
- Adoção de planos de gestão de risco em operações e cadeias de comando e implementação de códigos de conduta específicos para prevenir conflitos de interesse e corrupção, especialmente em operações militares e logísticas.
4. Consulta pública obrigatória
- Envolvimento de especialistas, entidades fiscalizadoras e sociedade civil em processos de reforma legislativa. Consulta pública obrigatória e participação da sociedade civil nas reformas legislativas relacionadas com contratação pública e Defesa.
5. Cumprimento dos compromissos internacionais
- Alinhamento com as obrigações assumidas por Portugal junto da OCDE, da UE e das boas práticas internacionais em contratação pública.
A TI Portugal continuará a monitorizar atentamente tanto o desenrolar das investigações como o processo legislativo que seja desenvolvido reafirmando a sua disponibilidade para colaborar com as entidades públicas e a sociedade civil na construção de um setor da Defesa mais transparente, íntegro e ao serviço do interesse público.
“As suspeitas levantadas pela operação ‘Torre de Controlo’ e as propostas de simplificação da contratação na Defesa expõem fragilidades sistémicas que não podem ser ignoradas. Uma ‘via verde’ não pode significar uma ‘via sem fiscalização’. O reforço da Defesa exige não só mais recursos, mas melhores garantias de integridade e responsabilidade.”— Margarida Mano, Presidente da Transparência Internacional Portugal