Pela devolução do dinheiro roubado ao povo angolano

Crédito: ICIJ

As revelações feitas pelo caso Luanda Leaks, a propósito dos negócios sujos de Isabel dos Santos e seus associados, mostraram como a riqueza de Angola foi cooptada por uma elite angolana, auxiliada e encorajada por políticos, homens de negócios e intermediários de centros financeiros de todo o mundo, com particular destaque para Portugal.

“Angola tem das mais altas taxas de mortalidade infantil do mundo. Cerca de 40% da população vive abaixo do limiar da pobreza e não tem acesso a água potável. O acesso a serviços públicos, infraestruturas e cuidados básicos continua a ser insuficiente. Enquanto isso, dinheiro é roubado aos cofres públicos por parte da elite angolana e fica estacionado em Portugal, sob a forma de imobiliário de luxo, participações em empresas portuguesas e depósitos em bancos. Este saque ao povo angolano tem que acabar e Portugal não pode continuar a ser um albergue de dinheiro roubado”.
– Susana Coroado, Presidente da TI-PT

Angola é um estado soberano desde 11 de novembro de 1975, data da Declaração da Independência relativamente a Portugal após o processo de descolonização. Depois de mais de três décadas de governação de José Eduardo dos Santos, o presidente João Lourenço herdou um país devastado. Esta devastação foi resultado da forte queda dos preços do petróleo e pelo aumento da dívida pública, que em 2018 atingiu o seu valor máximo – 65,5 mil milhões de euros – mas também da profunda degradação das condições de vida, provocadas por um regime cleptocrático que ao longo de sucessivos anos normalizou a corrupção, o nepotismo e a exploração massiva dos recursos do país pelo Presidente José Eduardo dos Santos e o seu restrito grupo de camaradas de partido e familiares, incluindo a filha mais velha de dos Santos, Isabel, considerada a mulher mais rica de África , com um património líquido de 2,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes.

Numa altura em que Angola país está a ser apoiado pelo Fundo Monetário Internacional (3,7 mil milhões de dólares) e Banco Mundial (500 milhões de dólares), e que ainda deve cerca de 500 milhões de euros a empresas portuguesas, é fundamental expor não apenas a corrupção endémica no país, evitando que a ajuda internacional seja desviada, mas também garantir que esse dinheiro não se transforme em fluxos financeiros ilícitos de Angola para offshores ou países da União Europeia, principalmente Portugal, que, claramente, se mantém disponível para continuar a lavar o dinheiro roubado ao povo angolano, comprometendo assim a paz social e o desenvolvimento sustentável.

Uma parte importante do dinheiro roubado ao Estado e ao povo angolano através da corrupção tem sido escondido em Portugal, sob a forma de ativos financeiros, imobiliário e participações em empresas. As relações Portugal-Angola são inevitavelmente manchadas por estes fluxos ilícitos, prejudicando a longa amizade entre os dois Estados, bem como cada um dos países: Angola fica despojada de recursos vitais para o seu desenvolvimento económico e humano, e Portugal deixa de ser, aos olhos dos angolanos, um parceiro confiável, ao mesmo tempo que as suas empresas perdem oportunidades.

Este dinheiro pertence ao povo angolano e tem de ser devolvido a Angola para poder ser reinvestido nos direitos básicos da população, como a saúde, a educação e a justiça, no crescimento económico do país e no cumprimento das suas obrigações de dívida externa a credores públicos e privados.

“A recuperação de ativos é uma matéria de Direitos Humanos e por isso essencial para o alcance dos objetivos de desenvolvimento sustentável definidos pelas Nações Unidas, mas tão importante como a celeridade na devolução do dinheiro que pertence a Angola é assegurar que esses montantes não continuarão a alimentar os esquemas de corrupção institucionalizados. O papel da sociedade civil, cidadãos e organizações, é fundamental para garanti-lo, quer através do diagnóstico de necessidades, quer através da monitorização do impacto de políticas públicas, quer trabalhando enquanto agentes de transformação social no terreno, pela implementação de projetos e iniciativas focadas na boa governança e combate à corrupção”.
– Karina Carvalho, Diretora Executiva da TI-PT

Consciente das responsabilidades de Portugal, a Transparência e Integridade junta-se assim ao povo angolano na sua exortação pela justiça, combate à corrupção e defesa dos direitos, apelando a que cidadãos angolanos e portugueses exijam em conjunto que a recuperação e devolução dos ativos resultantes da corrupção ao povo de Angola se faça rapidamente e que a atuação dos atores envolvidos não siga impune.