Uma Estratégia Nacional Anti-Corrupção que tarda em sê-lo verdadeiramente
A proposta de Orçamento do Estado para 2022 é uma pobreza de intenções e medidas, um chorrilho de generalidades e lugares-comuns, muito aquém das ideias e objetivos da Estratégia Nacional Anti-Corrupção (ENAC).
Aliás, o conteúdo do artigo referente ao “reforço do combate à corrupção, fraude e criminalidade económico-financeira” é integralmente igual à proposta de Orçamento do Estado para 2021 (artigo 31.º). À parte do ano, hélas, porque é diferente, e a referência à lei da organização da Polícia Judiciária, é todo igual.
Propõe-se, desde já, aos leitores que tentem ver as diferenças. E isto como se a ENAC não tivesse sido aprovada pelo Governo e nada tivesse acontecido. Na verdade, parece que se pretende mesmo isso, passar uma ideia de generalidades e de não vinculações, para não se comprometer nem concretizar.
A própria ENAC já fora criticada pela falta de densificação e concretitude de objetivos e omissão de prazos de implementação e dotações orçamentais, pois, sem investimento público, financeiro e gestionário, não passará de letra morta.
Daí também a necessidade e urgência de existir um planeamento pensado, densificado e referenciado em termos de medidas e de dotações financeiras na propostas do Orçamento do Estado para 2022.
Como já tivemos oportunidade de comunicar ao Governo, no âmbito da consulta da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção (primeira versão da ENAC), nenhuma estratégia com este objeto e âmbito pode ser apenas “um conjunto de boas intenções, tem também de ser um compromisso efetivo e assumido por todo o país, que está disposto a investir e a coordenar investimentos para a concretizar”.
Seria portanto expectável que o Governo aproveitasse a aprovação da Estratégia Nacional Anti-Corrupção e a previsível aprovação de diversas propostas de alteração legislativa com impacto em diversas áreas governativas e serviços e organismos públicos, bem como a criação de novas entidades públicas neste domínio e que o planeamento orçamental fosse mais laborioso e transparente. Não é o caso, infelizmente.
Esperemos que a execução da ENAC vá mais longe que o previsto nesta proposta de Orçamento do Estado, mas a espera por um final substancialmente efetivo e mais risonho é habitualmente uma espera de Godot, não só tarda… como nunca deixa de ser.
Opinião de Nuno Cunha Rolo
Vice-presidente da Transparência e Integridade