Importante demais para deixar arquivar
Entrou agosto e, à parte os briefings diários do COVID-19, o país parece ter ido de férias. Mas foi notícia esta semana que houve mais buscas domiciliárias e não domiciliárias no âmbito do processo das golas anti-fumo, aquelas que era suposto serem de proteção no combate aos incêndios mas eram afinal inflamáveis e que puseram o Ministro da Administração Interna, ao vivo, a cores e em direto, a bater numa esponja de um microfone a dizer que também era material inflamável e, portanto, perigoso em reportagem em incêndios.
Em causa estão alegados crimes de fraude na obtenção de subsídio, superior a 125 mil euros, corrupção passiva, participação económica em negócio ou abuso de poderes e branqueamento de capitais, num processo que tem constituídos sete arguidos, entre os quais o ex-secretário de Estado da Proteção Civil, Artur Neves e o presidente da ANEPC, Mourato Nunes, e que levou à demissão do adjunto do secretário de Estado da Proteção Civil, Francisco Ferreira.
Apesar de a Assembleia da República já ter entrado de férias, recebemos esta semana uma resposta ao nosso pedido de esclarecimentos sobre os funcionários pagos pelo Parlamento que prestam serviços nas sedes dos partidos.
Colocámos cinco perguntas à deputada Eurídice Pereira, que preside ao Conselho de Administração da Assembleia da República:
- Qual o número total de funcionários de apoio aos grupos parlamentares, deputados únicos representantes de partido político e deputados não inscritos, descriminado pelos grupos parlamentares e deputados onde prestam serviço?;
- Quantos dos funcionários de apoio mencionados no número anterior prestam funções fora das instalações da Assembleia da República, por exemplo (mas não apenas) destacados nas sedes partidárias?;
- Quais os mecanismos de controlo existentes na Assembleia da República relativos à recolha de informação e supervisão sobre onde prestam funções os funcionários mencionados no número 1?;
- Que nos faculte, caso exista, o suporte documental atestando os controlos mencionados no número anterior;
- Que nos faculte, para cada caso de funcionário destacado, cópia dos despachos de destacamento ou outros documentos que autorizam a prestação de tais serviços de apoio aos grupos parlamentares fora das instalações da Assembleia da República.
Na carta que nos foi remetida, a presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República, através do secretário-geral do Parlamento, limitou-se a fazer referências à lei que regula o pessoal de apoio dos deputados, sem responder a qualquer das nossas perguntas, o que nos leva a concluir o pior: que o Parlamento simplesmente paga os salários ao pessoal de apoio indicado pelos partidos, sem fazer quaisquer controlos ou verificações sobre se estes funcionários estão a fazer de facto aquilo que a lei manda: apoiar os deputados e não fazer serviço aos partidos.
Queremos acreditar que o descontrolo não é a regra e acreditamos também que pedir respostas claras às nossas perguntas, ponto por ponto, não é pedir muito. Iremos seguramente insistir nas nossas questões e pedir mais esclarecimentos, porque o assunto é importante demais para “arquivar” sem respostas. Teremos novidades na próxima semana.
Recordamos que todos os partidos representados na Assembleia da República já recebem uma subvenção pública para custear despesas partidárias, pelo que o eventual desvio de fundos do Parlamento para o mesmo propósito configura um duplo financiamento partidário, à custa da qualidade do trabalho prestado pelos parlamentares, que veem o seu pessoal de apoio ser desviado para fins partidários externos à Assembleia.
Antes de terminar, recordamos as palavras de João Paulo Batalha, nosso presidente da Direção: “Os partidos já são financiados pelo Estado. Que venham depois abocanhar dinheiro da Assembleia da República para reforçar as suas máquinas partidárias, degradando a qualidade do trabalho parlamentar é, além de ilegal, eticamente inaceitável. Precisamos de garantias de que os serviços do Parlamento não estão a acobertar estes abusos”.
É também por isso que trabalhamos todos os dias.