Os advogados são, por natureza, representantes dos interesses dos seus clientes. Se antes esta representação estava praticamente restrita ao âmbito judicial, hoje as funções de um causídico e os serviços que uma sociedade de advogados oferece estendem-se muito para além da barra do tribunal. Na realidade, a advocacia é hoje uma assessoria em várias frentes. Como tal, não devem estar excluídos de nenhuma regulação de lobbying.

Em segundo lugar, sem qualquer rasgo de ironia ou crítica, os advogados têm potencial para serem dos melhores lobistas. Precisamente porque sabem representar os interesses dos seus clientes e estão treinados a usar a melhor argumentação possível para convencer um terceiro da legitimidade da sua causa. E é disto que se trata quando se fala de lobbying, com a diferença que a parte terceira é um decisor político, administrativo ou regulador e não judicial. Além disso, dado que grande parte do lobbying incide sobre o processo legislativo e regulatório, o objeto de trabalho dos advogados. Temos, por isso, exemplos de advogados a fazer representar interesses junto do poder político. Numa audiência de uma comissão parlamentar em 2014, foi um advogado quem representou o lobby japonês do tabaco, tomando a palavra durante quase toda a sessão (como se pode confirmar pela acta da audiência). A nível comunitário, existem três sociedades de Advogados portuguesas inscritas no registo de transparência da União Europeia, sob a categoria “consultoria profissional, sociedade de advogados, consultores independentes”.

Por tudo isto, não parece existir justificação plausível para que ambos os projetos de lei sobre lobbying, do PS e do CDS, excluam deliberadamente estes profissionais. No debate sobre os diplomas, o deputado Pedro Delgado Alves defendeu que “um advogado, tem de identificar quem é que vem com ela. Mas o advogado não vem como lobbyista profissional, vem dar assessoria jurídica”. Surge a questão: e se o advogado surgir sozinho a representar uma empresa sua cliente? Não poderá ser ouvido? É uma opção inédita, mesmo em países onde se debate o tema, e que mais não parece que um favor a um poderoso grupo de interesse. Será interessante saber, de resto, o que acontecerá às sociedades de advogados inscritas no registo da UE se forem proibidas de fazer lobbying de forma tão expressa.

Finalmente, outras questões paralelas, mas não de somenos importância se colocam. No debate sobre incompatibilidades dos deputados, várias vozes se levantam contra qualquer impedimento da acumulação da função de deputado com a de advogado. Contudo, se estes projectos forem aprovados, surgirá uma situação caricata. Um indivíduo não poderá acumular duas funções privadas de natureza semelhante – advogado e lobista – mas poderá exercer uma função privada – advocacia – e ao mesmo tempo – ser parlamentar – apesar de todos os potenciais conflitos de interesse.

Susana Coroado,
Vice-Presidente da Transparência e Integridade

 

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2 thoughts on “Os advogados e o Lóbi

  • 19 de Janeiro de 2018 at 20:14
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    Do meu ponto de vista, os deputados deviam se lo em regime de exclusividade, ficando obrigados a fazer opção ?

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  • 27 de Janeiro de 2018 at 20:04
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    Concordo inteiramente com o comentário anterior: um deputado, tal como qualquer outro funcionário público, deveria sê-lo em regime de exclusividade.
    Ser deputado pressupõe desde logo um salário e regalias fabulosas, se comparandas à da genralidade das pessoas, logo não deveria ser possível conciliar tal cargo com outras atividades, que normalmente envolvem conflitos de interesses.

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