A exportação do velho produto português: o todo-poderoso intermediário

A investigação do Organized Crime and Corruption Reporting Project, publicada hoje pela revista Sábado, sobre os negócios de José Luís Arnaut na Sérvia não deixa dúvidas: em Portugal o conflito de interesses e as portas giratórias estão completamente desregulados, e ante o papel dos facilitadores nos negócios fantasma os poderes político, legislativo e regulatório assobiam para o lado.

José Luís Arnaut é um velho conhecido do público português, alguém que gira entre a política, a advocacia e os grande negócios opacos, intermediando a relações entre eles.

Considerado pelo Jornal de Negócios o 22.º mais poderoso do país, para além de ter sido antigo ministro do PSD, tem ligações ao futebol, aos casos BES e Luanda Leaks e ao opaco processo de privatizações que ocorreu em Portugal. Agora parece ter exportado a sua prática para fora do país.

Um currículo invejável, portanto, e que lhe abriu as portas para os “salões do mundo”, como o Bilderberg ou o Goldman Sachs, que ficou com 5% dos CTT que Arnaut ajudou a privatizar.

“Há muito que denunciamos a promiscuidade entre política e os negócios”, diz Susana Coroado, presidente da Transparência e Integridade. “José Luís Arnaut consegue ser um exemplo paradigmático de como em Portugal as portas giratórias se naturalizaram. Mas não só. É também um exemplo de como os grandes escritórios de advogados, escudados nas suas relações privilegiadas com o poder político, se posicionam à margem da regulação, sem prestar contas a ninguém”.

Ao longo dos anos, José Luís Arnaut saltou entre o apoio jurídico às privatizações e os órgãos sociais das empresas privatizadas, como a ANA. Não é, pois, de espantar a sua ligação à Vinci na Sérvia, quando esta mesma empresa ficou com a concessão dos aeroportos nacionais.

Não há coincidências”, prossegue Susana Coroado, para quem este novo escândalo vem uma vez mais dar razão aos sucessivos alertas da associação ao longo dos últimos 10 anos, quer sobre a falta de regulação de conflitos de interesses, quer sobre as relações demasiado próximas entre política e negócios, os riscos de corrupção nos processos de privatização, as parcerias público-privadas e concessões, e a ausência de compliance dos intermediários.

Já Karina Carvalho, Diretora Executiva da Transparência e Integridade, defende que “os facilitadores, ou intermediários, como deu nota o mais recente relatório da OCDE, são responsáveis pelo crescimento do crime financeiro e da indústria offshore, mas, como se viu recentemente no modo como a sua participação no caso Luanda Leaks tem sido tratado em Portugal, o nosso país encara o combate ao branqueamento de capitais de ânimo leve. Só assim se explica, por exemplo, que o Registo Central de Beneficiários Efetivos continue enfermo dos propósitos para que foi criado”.

Consulta as nossas recomendações na luta contra o branqueamento de capitais na nossa página sobre os Negócios Fantasma.