João Rendeiro em fuga e a Justiça portuguesa a ver
A Transparência Internacional Portugal considera que a fuga de João Rendeiro, ex-presidente do Banco Privado Português (BPP), é um sinal inequívoco da falta de eficácia e da ineficiência do atual sistema de Justiça, sobretudo tratando-se de processos envolvendo criminalidade económico-financeira, e lamenta que, tal como João Rendeiro, a Estratégia Nacional Anti-Corrupção encontra-se em parte incerta.
A TI Portugal acolheu com preocupação as notícias de que João Rendeiro saiu do país e da Europa, para evitar a extradição para Portugal, a fim de não cumprir as penas a que foi condenado, com a complacência da Justiça portuguesa.
“Uma justiça eficaz e atuante é um pilar fundamental do estado de direito democrático. A justiça para ricos é uma plutocracia, não uma democracia. E por isso uma das prioridades inscritas nos nossos contributos para a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção foi precisamente a de garantir uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais para, entre outros aspetos, melhorar os tempos de resposta do sistema judicial”, considera Susana Coroado, Presidente da TI Portugal
No texto publicado ontem no seu blogue, Rendeiro diz que fugiu para escapar a uma justiça injusta e portanto agora de pouco vale que o tribunal tenha ordenado que estivesse presente em audiência, a 1 de outubro, nem os mandados de captura internacional entretanto emitidos não conseguem fazer esquecer que o banqueiro que levou o BPP à falência mantinha a medida de coação mais leve – o Termo de Identidade e Residência –, bastando-lhe informar as autoridades judiciais para abandonar o país, apesar de somar um total de 19 anos e dois meses de prisão efetiva já decididos em julgamento.
E foi exatamente o que João Rendeiro fez, no passado dia 13 de setembro, antecipando que viajaria para Londres até final do mês, altura em que transitaria em julgado mais um dos processos em que é arguido. Deu, também, como morada de contacto, a embaixada portuguesa na capital britânica, onde, manifestamente, não vive, nem é diplomata ou funcionário público adstrito ao serviço diplomático.
Os advogados do BPP já tinham alertado as autoridades para o risco de fuga do ex-banqueiro, pedindo um agravamento das medidas de coação. Foram ignorados.
Como também foram ignoradas as recomendações da TI Portugal ao Governo para que desse prioridade ao “reforço do investimento em recursos humanos e técnicos” na Justiça, sugerindo, ao mesmo tempo, que fossem “exploradas soluções complementares, entre elas, legislação que imponha que, após a decisão condenatória, em primeira ou segunda instâncias, os recursos interpostos sejam de efeito devolutivo e não suspensivo, como ocorre atualmente, o que torna excessivamente moroso o termo do processo; e a criação de tribunais especializados em criminalidade económico-financeira”.
“A lentidão do sistema judicial, que permite um sem número de manobras dilatórias e que se deixa enganar desta maneira, não é uma justiça que cumpra o seu papel. Em que medida a Estratégia Nacional Anti-Corrupção vai combater esta ineficiência? Até quando vai ficar esquecida na gaveta?”, remata Susana Coroado.