Análise da Transparency International revela que o combate à corrupção em Portugal não avança e tem falhas ao nível da integridade na política
A edição de 2023 do Índice de Perceção da Corrupção (CPI), publicado anualmente pela Transparency International (TI), revela que o combate à corrupção em Portugal continua a não avançar e tem falhas ao nível da integridade na política.
No Índice de Perceção da Corrupção 2023, Portugal, que é avaliado no conjunto dos países da Europa Ocidental e União Europeia, obteve 61 pontos, fixando-se na 34ª posição em 180 países. Volta a igualar a pontuação registada em 2020, a pior registada desde 2012, continuando abaixo do valor médio da sua região (65 pontos). Desde 2012 que Portugal apresenta variações anuais mínimas na sua pontuação deste Índice.
Especificamente sobre o nosso país, o relatório da TI, publicado hoje, coloca Portugal como um dos países da Europa em que se registam falhas ao nível da integridade na política. No entender da TI, o facto de Portugal ter mergulhado numa crise política quando o Primeiro-Ministro António Costa se demitiu na sequência da detenção do seu chefe de gabinete, no âmbito da “Operação Influencer”, é um exemplo de como os escândalos de integridade política persistem, salientando a necessidade de serem reforçadas as regras relativas aos conflitos de interesses, às normas éticas e à transparência no exercício de funções públicas e nas atividades de lobbying. A Transparency International insta Portugal a colocar como prioridade na agenda política uma regulamentação mais rigorosa a este nível, após vários anos de atrasos.
Margarida Mano, que preside ao capítulo português da TI, coligação mundial de ONG’s anticorrupção, afirma que “os resultados do Índice de Perceção da Corrupção 2023 evidenciam que não basta a um país ter uma Estratégia Nacional Anticorrupção, é fundamental que esta seja efetiva no combate à corrupção. Quando os cidadãos em geral e as organizações internacionais não percecionam, ou não encontram evidências, do impacto das leis e dos mecanismos existentes, não conseguem confiar nos governos e nas instituições. Existe um interesse público significativo em garantir a transparência e integridade, bem como a responsabilização dos detentores de cargos públicos e políticos relativamente a políticas e legislação promulgadas. É importante ter uma ação eficaz.”
A análise da TI sobre os resultados do CPI deste ano analisa a forma como a injustiça e a corrupção se afetam mutuamente em todo o mundo. De acordo com o Rule of Law Index, o mundo está a registar um declínio no funcionamento dos sistemas de justiça. Os países com as pontuações mais baixas neste Index têm também pontuações muito baixas no Índice da Transparency International, o que revela uma clara ligação entre o acesso à justiça e a corrupção. Tanto os regimes autoritários como os líderes democráticos que minam a justiça contribuem para aumentar a impunidade da corrupção e, nalguns casos, até a incentivam, ao eliminarem as consequências para os infratores.
“A corrupção continuará a prosperar enquanto os sistemas judiciais não puderem punir os atos ilícitos e manter os governos sob controlo. Quando a justiça é comprada ou sofre interferências políticas são as pessoas que sofrem. Os líderes devem investir plenamente e garantir a independência das instituições que defendem a lei e combatem a corrupção. É tempo de acabar com a impunidade da corrupção“, afirma François Valérian, Presidente da Transparency International.
Resultados globais
O CPI 2023 evidencia que a maioria dos países fez poucos ou nenhuns progressos no combate à corrupção. A média global mantém-se inalterada (43), pelo décimo segundo ano consecutivo, com mais de dois terços dos países a registarem resultados inferiores a 50, o que indicia graves problemas de corrupção.
A Dinamarca (90) volta a encabeçar o índice deste ano pela sexta vez consecutiva, com a mesma pontuação do ano passado, seguida da Finlândia e Nova Zelândia, com 87 e 85 pontos, respetivamente. A Somália (11), a Venezuela (13), a Síria (13), o Sudão do Sul (13) e o Iémen (16) ocupam os últimos lugares do Índice. Todos estes cinco países têm a particularidade de estarem a ser afetados por crises prolongadas, na sua maioria conflitos armados.
No total, 23 países – entre os quais algumas democracias como a Islândia (72), os Países Baixos (79), a Suécia (82) e o Reino Unido (71), bem como alguns Estados autoritários como o Irão (24), a Rússia (26), o Tajiquistão (20) e a Venezuela (13) – atingiram mínimos históricos este ano. Desde 2018, 12 países registaram um declínio significativo nas suas pontuações, incluindo economias de rendimento médio-alto e alto como a Argentina (37), a Áustria (71), a Polónia (54), a Turquia (34) e o Reino Unido (71). No entanto, oito países registaram melhorias durante o mesmo período: Irlanda (77), Coreia do Sul (63), Arménia (46), Vietname (42), Maldivas (40), Moldávia (39), Angola (33) e Uzbequistão (31).
Quanto à região da Europa Ocidental e União Europeia (UE), a pontuação desceu de 66 para 65 pontos em 100. Apesar de continuar a ser a região do mundo com melhor pontuação, as medidas anticorrupção robustas continuam a ser prejudicadas pelo enfraquecimento das estruturas de controlo e supervisão e a erosão da integridade na política contribui para diminuir a confiança dos cidadãos na capacidade dos países europeus para enfrentarem os atuais desafios da região. Os dados revelam ainda que os esforços anticorrupção estagnaram ou regrediram em mais de três quartos dos países europeus e, desde 2012, apenas seis países melhoraram a sua pontuação, sendo que oito diminuíram.
Resultados da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP)
No seu conjunto, e tal como nos anos anteriores, os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) apresentam uma pontuação média muito baixa (39). A TI Portugal e outras organizações da sociedade civil dos Estados-membros continuam, como tal, a pugnar para que a agenda da CPLP inscreva o combate à corrupção como uma prioridade.
À exceção de Portugal (61) e de Cabo Verde (64) – que é agora o país com a pontuação mais alta dentro desta Comunidade, tendo subido 4 pontos desde o ano passado – todos os países da CPLP têm uma pontuação inferior a 50, correspondendo a nações com sérios problemas de corrupção.
Embora Angola (33), tal como em 2022, continue a ser um dos países que registou um avanço mais significativo (iguala a pontuação do ano passado, tendo subido 14 pontos desde 2018), mantém-se ainda muito distante do meio da tabela global, que pontua numa escala de 0 (percecionado como muito corrupto) a 100 (muito transparente).
Sabe mais sobre os resultados do CPI 2023 na página dedicada.