Combate à corrupção em Portugal é frágil e não regista avanços, revela análise da Transparency International

A nova edição do Índice de Perceção da Corrupção (CPI) publicado anualmente pela Transparency International, volta a apontar falhas no combate à corrupção em Portugal.

No relatório de 2022, a Transparency International assinala que a Estratégia Nacional Anticorrupção (ENAC) foi lançada sem diretrizes ou plano de monitorização, resultando em fraca aplicação e implementação lenta de medidas dirigidas à prevenção da corrupção no setor público.

No Índice de Perceção da Corrupção 2022, Portugal é avaliado no conjunto dos países da Europa Ocidental e União Europeia, não tendo registado evoluções significativas na última década, e desde 2012 que apresenta variações anuais mínimas. Com 62 pontos, volta a igualar a posição registada no ano passado – e também em 2019 – continuando abaixo do valor médio da sua região (66 pontos).

"Os resultados nacionais do Índice de Perceção da Corrupção 2022 refletem, em linha com os de anos anteriores, um combate anticorrupção débil e estagnado, com percecionados níveis de risco agravados de corrupção e, igualmente, falta de transparência e controlo no setor da defesa e segurança nacional."
Nuno Cunha Rolo
Presidente da TI Portugal

A Transparency International Portugal já havia alertado para as deficiências da Estratégia Nacional Anticorrupção, nomeadamente por ignorar praticamente por inteiro a questão da corrupção política. Algo que foi salientado aquando da publicação do Índice de Perceção da Corrupção 2021 e nas recomendações do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO).

O relatório da Transparency International publicado hoje refere ainda como problemático Portugal manter ativo o programa Vistos Gold, por aumentar os riscos de corrupção e ter vindo a colocar pressão no mercado imobiliário.

 

"O exemplo Vistos Gold é paradigmático das falhas identificadas porque coloca a nu não apenas a crónica falta de diligência devida, de controlo e de avaliação, suportada por sucessivos governos, mas sobretudo a enorme resistência em instituir a prevenção da corrupção, da fraude e do branqueamento de capitais enquanto política pública.”
Karina Carvalho
Diretora Executiva da TI Portugal

A análise da Transparency International sobre os resultados do índice global foca-se no impacto da corrupção na Paz e Segurança, revelando que, desde 2008, a paz global se deteriorou por força da corrupção. A corrupção mina a confiança nos governos e sua capacidade de proteger os cidadãos, levando ao aumento das ameaças à segurança que são mais difíceis de controlar. Por outro lado, os conflitos criam oportunidades de corrupção e torna os governos menos capazes de resolvê-lo.

Sobre Portugal, no relatório lê-se que o setor da defesa precisa de maior transparência e supervisão, fazendo notar que processos de contratação envoltos em secretismo e práticas de transparência financeira deficientes enfraquecem as salvaguardas contra a corrupção nas instituições de defesa do nosso país.

Já em 2021, a Transparência Internacional Portugal, reportando os dados do Government Defence Integrity Index, pedia a intervenção urgente da Assembleia da República, particularmente a Comissão de Defesa Nacional, na fiscalização do setor da defesa, atendendo ao facto de nos encontrarmos no grupo de países com risco elevado de corrupção neste setor.

Resultados globais

O Índice de Perceção da Corrupção 2022 demonstra que, apesar dos esforços concertados e de muitos ganhos duramente conquistados, não podemos considerar o progresso contra a corrupção garantido. A escala do problema é enorme: a média global permanece inalterada – com uma pontuação de 43 em 100, pelo 11º ano consecutivo – e mais de dois terços dos países (122, no total) têm um sério problema de corrupção, com uma pontuação abaixo de 50.

A Dinamarca volta a encabeçar o índice deste ano, com 90 pontos, mais dois do que no ano passado, seguida da Nova Zelândia e Finlândia, com a mesma pontuação (87). Síria, Sudão do Sul (13) e Somália (12) continuam nos últimos lugares. Destes três países, apenas o Sudão do Sul melhorou a sua pontuação (tinha 11).

A região com pontuação média mais baixa é a África Subsariana (32), seguida da Europa Oriental e Ásia Central (35).

A região com a pontuação média mais alta é a Europa Ocidental e a União Europeia (66), mas mesmo aqui o progresso é insipiente. Os dados do CPI 2022 revelam que os esforços anticorrupção nesta zona do mundo estagnaram em mais da metade dos países, e por mais de uma década. Dos 31 países da região, apenas seis melhoraram suas pontuações, enquanto sete diminuíram, e dez registaram as suas pontuações mais baixas, incluindo o Reino Unido (73), que caiu cinco pontos desde o ano passado

A corrupção tornou o nosso mundo num lugar mais perigoso. Como os governos falharam coletivamente em fazer progressos neste âmbito, acabaram por alimentar o atual aumento da violência e do conflito – colocando os cidadãos em perigo. A única saída é os Estados produzirem trabalho árduo, erradicando a corrupção a todos os níveis, garantindo que os governos trabalham para todas as pessoas, e não apenas para uma pequena elite".
Delia Ferreira Rubio
Presidente da Transparency International

Resultados da CPLP

No seu conjunto, os países integrando a CPLP apresentam uma pontuação média muito baixa (38), razão pela qual a TI Portugal e outras organizações da sociedade civil dos Estados-membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa exigem que a agenda da CPLP inscreva o combate à corrupção como uma prioridade.

Todos os países da CPLP têm uma pontuação inferior a 50, correspondendo a nações com sérios problema de corrupção, excetuando Portugal e Cabo Verde. E, dos nove, apenas quatro estão posicionados acima do meio da tabela: Portugal (33), Cabo Verde (35), São Tomé e Príncipe (65) e Timor-Leste (77).

Numa posição abaixo da tabela global continuam Guiné Equatorial (171), Guiné-Bissau (164), Moçambique (142), Angola (116) e Brasil (94). Angola foi um dos países que registou avanço estatístico significativo (com 33 pontos, subiu 4 desde 2021), no entanto, mantém-se ainda muito distante do meio da tabela global, que pontua numa escala de 0 (percecionado como muito corrupto) a 100 (muito transparente).

Consulta AQUI a página dedicada ao CPI 2022, onde podes ficar a conhecer a metodologia e os resultados nacionais e globais.