Cidadãos mais exigentes formam democracias e instituições mais robustas
Após décadas de silenciamento, a corrupção, nas suas múltiplas formas, está nas agendas mediáticas nacionais e internacional. Tal circunstância não é motivo de regozijo ou de celebração. E só a deformidade ética e intelectual pode supor estarem hoje mais felizes aqueles que, desde há tantos anos, fazem da denúncia da corrupção a sua causa. Ou que, para fazerem ouvir mais alto as suas vozes, se deixam rebocar pelo populismo, ou por influência de quaisquer outras forças ocultas ou interesses inconfessos, procurando destruir as instituições, os eleitos, enfim, as fundações da democracia.
Se falamos mais de corrupção nos dias de hoje do que no passado é porque os seus efeitos, longe de estarem mitigados com o passar do tempo, crescem e ganham uma amplitude nunca vista.
Hoje, mais do que nunca, a corrupção é a grande responsável pela situação de miséria extrema que se observa em muitos cantos do globo e, para muitos de nós, felizmente cada vez mais em número, torna-se impossível olhar sem comoção, indignação ou fúria, para o modo como a corrupção, a má governança e o desvio de recursos continuam a destruir, a tanta gente e em tantos lados, qualquer possibilidade de uma vida digna.
É certo que há uma lista infinita de obstáculos que se podem colocar ao crescimento económico, à estabilidade política e ao exercício de liberdades e garantias fundamentais. E, sendo verdade que muitos desses entraves podem ser fruto do contexto particular de cada país e de cada região, eles dificilmente se resolvem quando decisores políticos e gestores públicos se encontram capturados pela corrupção e por interesses outros que não a promoção do bem comum, impedindo a consolidação de instituições íntegras, mais eficazes e mais responsáveis.
Na Transparência Internacional Portugal trabalhamos para combater a corrupção, em defesa dos Direitos Humanos e em prol do desenvolvimento sustentável.
De entre as iniciativas mais recentes destacamos o trabalho desenvolvido para aprovação de uma Estratégia Nacional Contra a Corrupção, as campanhas em torno dos riscos de branqueamento de capitais associados aos Vistos Gold, do reforço da integridade na política através do estabelecimento de regras de conduta e prevenção do enriquecimento ilícito, a investigação sobre os magistrados no governo, ou a aplicação, pela primeira vez em Portugal, de um Pacto de Integridade, que nos permitiu compreender mais de perto as debilidades do sistema de governança dos fundos públicos, seja na área da contratação pública, seja na implementação do Plano de Recuperação e Resiliência.
Também fora de portas temos dado o nosso contributo, quer colaborando com os nossos parceiros da rede Transparency International ao nível europeu, quer solidificando as pontes com ativistas e organizações anti-corrupção na CPLP, porque, como se viu com o caso Luanda Leaks, envolvendo a angolana Isabel dos Santos, e na rede de negócios ligados à elite liderada por Teodor Obiang, presidente da Guiné Equatorial, o nosso país continua a ser local privilegiado para esconder e investir dinheiro de proveniência ilícita.
Graças ao apoio dos nossos associados, ao longo dos últimos 10 anos conseguimos fazer crescer o movimento organizado anti-corrupção em Portugal, apresentando soluções para reforçar os mecanismos de prevenção e alertando para as deficiências nos sistemas de deteção, investigação e de punição da corrupção e da fraude.
Mas estamos apenas no começo do caminho.
O que as instituições e a democracia são depende em larga medida do que os cidadãos demandam que elas sejam, e por isso é necessário que sejamos muitos mais, e com maior impacto cada dia.